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baú das alembranças

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Vitorias e derrotas--- Carlos Esperança

Vitórias e derrotas

Não há vitórias eternas, nem derrotas definitivas. O processo de acumulação do capital levou à concentração da riqueza em cada vez menor número de pessoas. Há de atingir um ponto de fratura.´

Os tempos que correm, no dealbar da quarta revolução industrial, em que pela primeira vez os postos de trabalho destruídos são em maior número do que os criados, com robôs capazes de substituírem as pessoas, não tem uma resposta política para os desequilíbrios criados, e acentuados pela incontrolável explosão demográfica mundial.

Pelo contrário, com a multidão crescente de desocupados, exige-se a quem tem emprego que aumente a frequência, duração e intensidade do trabalho, fruto da ganância de quem acumula capital e do desespero do número crescente de marginalizados.

Não é apenas a riqueza que urge distribuir, é o próprio trabalho e a sua retribuição, pois acabará por ser insustentável que não se dividam ambos, para maior equilíbrio social.

Só existe uma situação em que os ricos arriscam tanto quanto os pobres, perdendo o que têm, seja pouco, muito ou nada, e a própria vida. É numa situação de guerra. E este é o cenário previsível na espiral que juntará os conflitos regionais num único e catastrófico.

Falhadas, ao longo da História, as posições conservadoras, parece um contrassenso que a deriva reacionária, xenófoba e nacionalista conquiste tão vastas camadas da população mundial.

As sementes lançadas por Bernie Sander nos EUA, durante a campanha presidencial, e a recente vitória da reeleição do líder trabalhista, Jeremy Corbyn, com 61,8% dos votos dos militantes, abrem uma oportunidade para o combate ideológico contra o imparável êxito com que o ultraliberalismo ameaça a Humanidade. A próxima batalha é favorável ao último, mas não há vitórias eternas, e só se dececionam os cobardes que desistem de lutar.

Os dados da Pordata e a minha realidade

Mesmo assim eu ponho sérias reservas.
Eu tive uma vida de trabalho remunerado que se saldou por 52 anos.
Eu pertenci à tal base média dos trabalhadores já que o meu ordenado e da minha companheira rondava os 1. 500 euros.
Por essa lógica dos 200 anos igual a poupanças de um milhão de euros, no fim de cinquenta anos eu deveria ter poupanças de 250.000 €, mas a verdade é que:
Com as despesas inerentes ao sustento de uma casa de família, ao pagamento da renda de casa, às despesas da água, do gaz, da
electricidade, do telefone, dos impostos, ao crescimento e à educação de um casal de filhos, a verdade é que no fim de uma vida activa e contributiva, no banco não restaram poupanças nenhumas dignas desse nome.
E nem sequer eu e a minha companheira podemos ou devemos ser acusados de maus gestores, porque para gerir o orçamento doméstico quase sempre foi preciso fazer alguma ginástica.
Posto isto, acho que mais de três milhões de famílias portuguesas compreendem o que quero dizer.

 
Uma Página Numa Rede Social
16 h ·

Dêem-nos dois minutos de atenção, por favor. Prometemos que fá-los-emos valer a pena.

Segundo dados da Pordata, a remuneração de base média dos trabalhadores portugueses é pouco superior aos 900 euros. Em 2014, era de 904,5 euros, para sermos exactos. Façamos as contas por alto e digamos que um agregado familiar médio em Portugal tem 2000 euros de rendimento disponível por mês. Agora, suponhamos que este casal médio tem um filho. Segundo dados da Pordata, o índice sintético de fecundidade, que afere a média de filhos por mulher em idade fértil, determina que as mulheres portuguesas tiveram cerca de 1,3 filhos, em 2015.
Portanto, neste cenário, temos um casal português com um filho e que aufere, em conjunto, cerca de 2000 mil euros/mês.
Sejamos extraordinariamente optimistas e digamos que, após todas as despesas fixas e variáveis estarem pagas, este casal consegue poupar cerca de 1000 euros por mês. Ou seja, após todas as despesas com renda, ou empréstimo para habitação, com alimentação, contas da casa, educação, transporte, vestuário, imponderáveis, etc., este felizardo casal com um filho ainda consegue pôr de lado 1000 euros/mês, que corresponde a 50% do seu rendimento.
Neste cenário, este casal conseguiria poupar cerca de 12000 euros/ano. Ou seja, para alcançar os 500 mil euros em património, que eventualmente poderá ser considerado para o agravamento do imposto em estudo pelo Governo, o casal do nosso cenário demoraria mais de 40 anos para alcançar este escalão. Portanto, só após 40 anos de total estabilidade e com a vida a correr mesmo muito bem é que um agregado familiar médio teria de pagar um imposto que ainda nem sequer foi decretado e que, se for, provavelmente já nem existirá daqui a dez anos, quanto mais daqui a 40.

Mas preparem-se, a parte realmente fofa vem agora. Segundo os dados do INE, as famílias portuguesas só conseguem poupar cerca de 10% do seu rendimento disponível. No nosso cenário, extraordinariamente optimista, o casal descrito poupava 50%. Portanto, sendo realistas, em média, um casal que tenha 2000 euros de rendimento disponível por mês só conseguirá poupar cerca de 2400 euros por ano (e não 12000). Neste cenário, um casal normal em Portugal demoraria mais de 200 anos a alcançar o nível de poupança necessário para poder comprar imóveis no valor do escalão que está a ser considerado para aplicação do novo imposto.

Vamos repetir isto, para que fique bem claro: com um cálculo simples, que considera os dados da Pordata e do INE, é possível determinar que um casal perfeitamente comum em Portugal demoraria mais de 200 anos a alcançar o nível de poupança necessário para poder comprar imóveis no valor do escalão que está a ser considerado para aplicação do novo imposto.

200! Anos!

José Gomes Ferreira e a Milícia de Defesa dos Ricos não são só intelectualmente desonestos. Eles são bem piores que isso. São uns fofos, vá.
Ironicamente, esta polémica toda começa a ser realmente produtiva, pois está a mostrar a verdadeira cor desta malta, e os interesses que fanaticamente defendem.
Uma Página Numa Rede Social
#somostodosclassemedia

A Guerra Colonial

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A guerra colonial e o branqueamento da ditadura

Quando Portugal iniciou a guerra colonial em Angola, logo alargada à Guiné e, depois, a Moçambique, já a França estava a acabar de perder a sua (1954/62). O colonialismo francês sofreu, na Argélia, a última derrota. Em Portugal, país atrasado, durou ainda 12 anos, e foi na Guiné que primeiro enterrou as últimas bravatas imperialistas.

A Argélia francesa foi o mito cultivado que levou um grupo de oficiais a sublevarem-se na sua defesa, quando a guerra já estava inexoravelmente perdida. Foram condenados à morte. De Gaulle comutou-lhes a pena. Foi inútil o sangue derramado.

Portugal cultivou um mito exclusivo, Portugal, do Minho a Timor, como se a História parasse e a ditadura pudesse perpetuar a guerra injusta, criminosa e votada ao fracasso.

As coisas são o que são e não o que gostaríamos. Confrange ver o malogrado continente africano, vítima da miséria, ignorância, tribalismo, doenças, fome e guerras. Não possui um único país claramente democrático ou próspero. Angola e Moçambique são ainda os países que mais se aproximam de Estados de direito.

A tragédia da descolonização, de qualquer descolonização, trouxe sempre sofrimento e injustiças, próprios das revoluções. A descolonização é uma revolução permanente, e a portuguesa foi tão tardia que impediu minimizar o desastre e acautelar alguns interesses legítimos. Houve na colossal tragédia apenas uma epopeia. Tivemos o único exército do mundo capaz de uma retirada gigantesca sem uma única baixa.

Hão de passar gerações antes de exorcizarmos as atrocidades e de secarem as lágrimas dos inocentes que vieram e das vítimas que lá ficaram, antes de contarmos o que, de um e de outro lado, envergonha e estarrece.

Hoje, por todo o País, à sorrelfa, vão surgindo praças, ruas e monumentos dedicados aos ‘Heróis do Ultramar’. Não homenageiam os milhares de mortos, os estropiados e os que sobrevivem a sangrar por dentro, todos vítimas da ditadura, que inutilmente se bateram durante treze intermináveis anos. Apenas se procura reescrever a História.
Está em curso uma campanha de branqueamento da ditadura, o apelo emocional a quem se esqueceu da injustiça da guerra, da inutilidade do sacrifício e do sofrimento próprio e da família. É um apelo à desmemória, à emoção dos velhos, para esquecerem os algozes e se deixarem seduzir por uma leitura enviesada e branqueadora da guerra colonial.

Como antigo combatente, repudio os truques com que se pretende branquear a ditadura e exaltar o «Império, infelizmente perdido». Não há, nunca houve, «heróis do ultramar», há vítimas da guerra colonial. De ambos os lados.

Como cantávamos no Niassa: «Estou farto deles, estou farto deles…».

By Carlos Esperanca.

 

Ajuste de contas

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AJUSTES DE CONTAS

Este tipo de trauliteiradas raivosas, ajustes de contas mesquinhos entre gente de baixo estofo moral, deixam sempre um enjoativo cheiro a esgoto.
Um antigo jornalista medíocre e um politicão sem qualidades, o primeiro com evidente fascínio pela espionite e, talvez, leitor de sub-John le Carrés de capa mole, o segundo com uma tendência notória para se rodear do que há de pior na fauna politico-socio-financeira que gravita à volta do Poder, encontram-se. Ambos vêem a política como uma sucessão de golpadas e vilanias, apimentadas por "spin" e "favores" por baixo da mesa. Verem-se, avaliarem-se e concluirem que podem ser úteis um ao outro, foi obra de um momento. Vivem em simbiose até que, pela ordem natural que rege a vida dessa gente, um deles conclua que o outro deixou de ser útil e a inevitável traição acontece.
Veja-se como o ex-amigo do sinistro Cavaco, caído em desgraça depois da inenarrável (e falhada) maquinação das "escutas a Belém", se sujeita a ser tratado "após vinte anos de leal colaboração".
No livro que acaba de cometer, "relata dez anos em Belém: quatro como assessor de imprensa, seis na sombra, enfiado num gabinete do sótão"! Seis anos de "apagamento, definhamento, 'caminho das pedras' " mas durante os quais aceitou o humilhante esconso, sem dizer "água vai", mantendo de Conrado o prudente silêncio, que dinheiro não cai do céu e o emprego não abunda.
Não se tratasse do reptiliano Cavaco Silva, o qual de leão tem pouco, e poder-se-ia citar o apólogo do Leão e do Burro.
Estão bem uns para os outros.

Carlos Esperança

12/80 – Pelos caminhos-de-ferro e da vida – Crónica de fim-de-semana

O trama era o comboio diário que, vindo de Vilar Formoso, chegava à Guarda pouco depois das nove horas da manhã e regressava às cinco da tarde em sentido inverso. O nome ficara do inglês Tramway e era exclusivo do referido comboio, bem mais ronceiro e acessível que o correio, o rápido ou o Sud, parando em todos os apeadeiros.

No último dia de setembro e nos primeiros de outubro, a 3.ª classe regurgitava de gente e de mercadorias que se acondicionavam nos corredores, debaixo dos bancos, nos cacifos junto ao teto, nas plataformas de acesso às carruagens e entre os passageiros. Adolescentes de ambos os sexos e várias mulheres entre os trinta e os quarenta anos, envelhecidas por numerosos partos, lides do campo e privações, vigiavam as bagagens que ocupavam todos os espaços vagos, servindo os sacos de batatas, entre os bancos, de estribo aos passageiros.

Na estação da Guarda apeavam-se, reuniam os pertences e transportavam-nos até à paragem das camionetas. Detetados os passageiros sem bagagem, pediam-lhes os que tinham demasiada para assumirem como sua parte dela, a fim de poderem transportar na camioneta tão vasta carga sem pagamento extra. Recebiam a ajuda pedida e a piedosa mentira tinha a compreensão e cumplicidade do cobrador de bilhetes, que fingia ignorar tão simplória tramoia, não fosse ele também um homem do povo igualmente sacrificado por trabalhos e privações.

Os jovens partiam lestos, a pé, calcorreando a distância que separava a Estação da Sociedade de Transportes, na cidade, a fim de carregarem as bagagens até casa, quando chegassem. Se a camioneta se adiantasse, lá estariam à espera os volumes e quem os guardava e, às vezes, antecipavam-se eles à camioneta, que ia pelo Rio Diz, veículo vetusto e lento que se queixava do peso e da subida e resfolegava nas paragens. Poupavam os peões o bilhete, que custava 2$50 a cada passageiro.

Entre 1 e 7 de outubro não havia aulas. O primeiro dia servia para apresentar aos alunos Sua Excelência Reverendíssima o Senhor Bispo, Governador Civil, Presidente da Câmara, Reitor, Comissário da Mocidade Portuguesa, excelentíssimos e doutores todos eles. O cerimonial servia para mostrar aos rústicos alunos o poder e a autoridade, o respeitinho era muito bonito, e ensinar a aplaudir quando qualquer deles tartamudeasse umas trivialidades.

Depois era uma semana de azáfama para celebrar os contratos da luz e da água e colocar os contadores, com os putos e as meninas já instalados e separados em quartos transformados em camaratas. A água era fria e o simples ato de lavar as mãos um sacrifício que se fazia com parcimónia, sendo o banho semanal um hábito de gente fina.
Entretanto os alunos deslocavam-se ao liceu a tomar nota da turma, dos horários, das disciplinas e dos livros que urgia comprar. E aprendiam que no rés-do-chão ficavam as meninas e no primeiro andar os rapazes.

Depois de se inteirarem dos livros que podiam usar dos irmãos mais velhos, e dos que podiam comprar em segunda mão, por metade do preço, no Pinto, junto ao cinema, lá iam às livrarias do Sr. Felisberto ou do Sr. Casimiro comprar os restantes e pedir os horários, impressos onde se anotavam os dias e as horas das aulas de cada disciplina, oferecidos pelos livreiros num gesto de simpatia e boas-vindas.

A maior parte hospedava-se em casas particulares, autênticas colmeias, onde a mesada era paga em géneros: pão, batata, azeite, toucinho, feijão e outras vitualhas, que variavam consoante a origem dos hóspedes e a colheita agrícola dos pais, com a propina de 100$00 mensais, a única contribuição fixa e sem discussão.

Alguns ficavam em casas de funcionários públicos que arredondavam magros salários com os hóspedes, mas outros tinham o arrimo de uma mulher que aos seus juntava os filhos alheios e a todos cuidava. Eram camponesas cujo instinto fez governantas para darem aos que velavam o futuro que não tiveram.

Foi assim que muitos alunos se iniciaram no ensino secundário. A abnegação das mulheres rurais, tantas vezes analfabetas, duramente arrancadas à horta, ao marido e ao habitat, contribuiu para a escolarização do país e para dar aos filhos um rumo que os afastou da pobreza, e para criar quadros que, a partir de 1960, começaram a mudar a face de Portugal, enquanto o imobilismo da ditadura mantinha o paradigma de nação rural, temente a Deus, pobrezinha, mas honrada.

Algumas dessas mulheres, heroínas anónimas, moiras de trabalho e abnegadas, ainda rumaram a Coimbra para apoiarem os filhos, os próprios e os alheios, que ousaram a Universidade e viraram doutores com calos nas mãos no início de cada ano letivo.

Da odisseia coletiva, do sacrifício silencioso, do desassombro destas mulheres da Beira nunca se fez o inventário das lágrimas, privações e afoiteza que ajudaram a mudar Portugal. Depois de cumprida a missão, regressavam às terras e à lavoura, ao mau feitio dos maridos e às lides da casa, às novenas e promessas pias, para que os filhos que criaram não perecessem na guerra que consumia jovens e destroçava pais num conflito obstinado que a ditadura manteve contra a história, o bom-senso e o direito dos povos à autodeterminação.

Já poucas restam dessas mulheres ignoradas. Estão por contar histórias de vida, retalhos da memória de um povo que parece envergonhar-se do que mais o nobilita, e esquecer as raízes que são pergaminhos da honra nos caminhos da vida.

Há, talvez, na amnésia coletiva, a ingratidão dos filhos e a vergonha de novos-ricos, que esqueceram a abnegação das mães e a solidão dos pais que ficavam a mourejar nos campos e se privaram das companheiras, numa dádiva cujo sacrifício se adivinha.

Jornal do Fundão em 27.09.2007

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